terça-feira, 1 de julho de 2008

Ao mestre, com carinho


Para a primeira edição da Revista Família São José - um informativo escolar produzido pelo instituto onde eu trabalho em Peabiru - tive a felicidade de entrevistar Dona Mercedes, uma educadora aposentada, dona de uma simpatia única. O resultado da conversa está no texto a seguir.

Passos lentos pelos corredores da escola. Lá vem Dona Mercedes, ou Vó Mercedes, como ainda é carinhosamente chamada pelos alunos da Escola São José a professora que, pela simpatia, sabedoria e simplicidade, tornou-se uma espécie de Dona Benta da escola. Depois de despedir-se do netinho, que acompanha diariamante até a fila da Educação Infantil e de um bate-papo rápido com a secretária Sueli, ela segue para uma entrevista informal, em que conta alguns de seus momentos importantes como educadora.

Mercedes Bassi Alves nasceu em 4 de agosto de 1933, na cidade de Coroados no interior do Estado de São Paulo. Viúva e mãe de duas filhas – uma das quais, também professora – ela se lembra que quando menina nem pensava que seria educadora. Seu sonho? Ser modista, uma vez que tinha muita habilidade para corte e costura. Todavia, por sugestão do pai, acabou abraçando o magistério. Dona Mercedes faz questão de mencionar a importância que o pai dava à figura do professor e de como, em apenas um mês, aprendeu em casa as 23 lições da cartilha, com a ajuda da mãe. Embora não tivesse freqüentado escolas, mantinha-se informado, instruindo-se com a leitura de jornais ou mesmo de clássicos da literatura nacional. Tudo isso cativou Dona Mercedes e fez com que, logo depois de sua chegada a Peabiru, na década de 50, ela assumisse uma pequena turma na comunidade São Roque, permanecendo ali por dois anos.

Depois dessa primeira experiência em sala de aula, passou a lecionar na Escola de Aplicação Professor Nuno Souza e Silva – onde atualmente encontra-se a Escola Municipal Paulo Freire – auxiliando na regência do Pré-Escolar e também colaborando com as alunas da Escola Normal Colegial Olavo Bilac a realizarem ali suas aulas práticas. Foi um tempo importante que, segundo ela, ajudou-lhe muito se aprimorar na arte de educar.

Ao se lembrar da época em que atuou na Escola Estadual Emílio de Menezes, um sorriso. Vêm-lhe à memória ocasiões cômicas, como quando ela e a irmã, Dona Diolina, tiveram que apartar uma briga de mães na porta de sua classe; ou ainda quando se surpreendeu com a agilidade dos alunos, ao pedir-lhes uma simples frase e estes lhe entregarem prontamente uma verdadeira redação. “A gente às vezes subestima a capacidade das crianças...”, confessa, rindo copiosamente. Daquela época, cita algumas professoras, mas faz questão de elogiar eloqüentemente uma colega que, segundo ela, foi-lhe como uma autêntica mestra: Dona Rosa Delconte Ferreira, com quem aprendeu alguns truques sobre como favorecer a aprendizagem dos alunos.

Graças a essas dicas, ela pôde encarar, não sem esforço, uma turma com problemas de indisciplina na Escola Estadual 14 de Dezembro, que lhe serviu para aprender o que agora ela ensina com a serenidade de quem sabe o que fala: “Ser professora exige muito. Muito mesmo”. E, enquanto menciona saudosamente colegas daquele estabelecimento, subitamente pára de falar e olha para o nada, como quem lembra de algo relevante que ainda não mencionara... É a lembrança de ex-alunos que lhe vem à tona. Dona Mercedes fala orgulhosa que professores, médicos, políticos, advogados e outros profissionais bem-sucedidos já estiveram numa carteira escolar de uma de suas turmas. “Nossa profissão é muito importante, porque todas as outras dependem dela”, comenta.

Ela conta que, já aposentada, foi convidada pela professora Judith Simonelli a trabalhar na Escola São José. Ali, Dona Mercedes poderia realizar seu primeiro sonho: ser costureira. Ela aceitou. E, com talento inato, confeccionou becas, cortinas, fantasias e tudo mais quanto fosse necessário. “Fui muito bem acolhida por todos: professores, funcionários, padres, alunos... Encontrar os professores e conversar com eles na hora do café era como uma terapia para mim. Todos sempre me respeitavam e me tratavam com muito carinho. As crianças até me pediam a bênção”, suspira. Ela lembra que quando, por motivos de saúde, teve que sair da escola, onde permanecera por mais de uma década, ficou muito abatida. “Chorei por quase três meses. Não agüentava ficar longe da minha escola...” recorda, visivelmente emocionada.

Depois de um momento de pausa, outro sorriso. “Tenho que fazer o almoço”, lembra. E assim, ela encerra o bate-papo, prometendo voltar no dia seguinte para uma foto, usando o colar que ganhara da sobrinha. Na porta da biblioteca, onde acontecera a conversa, encontra-se com uma funcionária: um abraço demorado. Já na saída, um menino pede-lhe a bênção.

– Deus te abençoe, meu filho! Deus te abençoe!

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